domingo, 7 de fevereiro de 2010

À uma grande amiga

  

Sim, eu voltei para examinar o passado, e hoje meu passado se chama amizade, e meus amigos se chamam saudade. Posso dizer dos amigos que tenho que são meus melhores amigos, os melhores do mundo. São numerosos os que me saúdam, mas íntimo de minha casa apenas um a cada mil.
  A primeira vez que experimentei a dor da separação de um verdadeiro amigo foi a onze anos, seu nome é Thaís. Como esse nome fez doce minha infância e adolescência, eramos como irmãs; a lacuna que se abriu em minha alma quando a vida colocou mais de mil quilometros entre nós, nunca se fechou.
  Hoje tenho uma vontade tímida de saber em quem ela se tornou, e um pesar por não ter estado por perto quando ela se tornou mãe, ou quando conheceu seu marido. As vezes encontro no sorriso de alguém estranho, o jeito tão familiar do sorriso que coloriu durante anos minha vida.
   As cartas que trocavamos nos primeiros anos de separação se não se perderam, estão em algum canto, onde passam desapercebidas, mas o formato grande e arredondado de sua letra ficou gravado em minha memória.
  Gostaria de dizê-la que tenho guardado comigo cada momento, e se fecho os olhos posso sentir o cheiro da casa onde ela morava, lugar que foi meu segundo lar, que guardo com ternura  o primeiro anelzinho usado por ela quando bebê confiado a mim na despedida, que ainda me lembro o ruído singular que sua garganta faz pouco antes de expirrar. Não esqueci o segredo por ela ensinado de como fazer um café infalível; e que todas as vezes que misturo arroz com feijão na mesma panela ainda me lembro dela. Seu jeito de dançar, de sorrir e de chorar, ficaram comigo guardados, até que o reencontro me diga em que se converteram.
  Há seis anos não a vejo, mas sei que quando a encontrar, será como sempre foi, como se não houvesse tempo nem distância, distância essa que muito aumentou, mas que nunca, por nenhum momento corroeu ou diminuiu nossa amizade. Pois amigos são irmãos, e a fraternidade é um laço inquebrável.
  Continuarei enganando meu coração, em relação a distância que me separa de todos meus  bons amigos, dizendo que os amigos estão no lugar que devem estar, e que permanecem por perto, enquanto Deus achar necessário.













terça-feira, 2 de fevereiro de 2010

Feliz a Nação cujo Deus é o Senhor!





Cristo Pantocrátor (Senhor do Universo) na técnica encáustica, século 5, Mosteiro de Santa Catarina no Monte Sinai, entre Israel e Egito.

Em Jerusalém e arredores da Ásia Menor o Cristo já era pintado nessa técnica própria das múmias egípcias, com barba, olhos escuros e cabelos lisos, como era o homem da região nessa época e segundo grande tradição. 
"Inspirada no juízo final Esta imagem foi propositalmente postada neste texto, pois esta arte sacra representa Jesus com a feição ao mesmo tempo misericordiosa e irada. É o rei-juiz que diz aos que estão à sua direita: "Vinde benditos!"; e aos da esquerda: "Apartai-vos, malditos! . Reúnem num só rosto, de forma paradoxal, as duas formas de Deus nos amar: a compaixão e a ira.
Quando olhamos para as metades separadas do rosto, conseguimos enxergar quase que duas pessoas diferentes." 
(um olhar que cura, Pe. Paulo Ricardo)
[Senhor],
Ninguém vos perde, a não ser quem vos abandona. E porque abandona,  para onde vai ou para onde foge senão para longe de ti misericordioso e para perto de ti irado?
(Santo Agostinho, Confissões).




Desde já peço desculpa a todos, cujo meu modo de pensar possa contrariar, no entanto, o livre arbítrio, me permite falar de um assunto tão delicado que por tantas vezes possa parecer preconceito, como em inúmeras ocasiões fui intitulada, no entanto a meu ver preconceito é falta de respeito; e não devo aceitar tudo só pra dizer que sou tolerante, e sou, ou não preconceituosa que também sou, pois se há uma coisa pela qual prezo é o respeito, sobretudo pelo ser humano.
A verdade é que quando se trata de fé, Deus, religião, não há como ser imparcial. E hoje vou falar de Haiti, vudu, e tragédia.
Toda a desgraça que se abateu sobre o Haiti, me chamou muito atenção, aliás esse país sabe chamar atenção, por tão constantes desventuras que o cerca, fome, miséria, aids, o país mais pobre da América Latina, senão do mundo; mas o que de fato me intrigou foi a imagem dos destroços da igreja que foi destruída completamente pelo terremoto, a mesma igreja onde se encontrava a missionária Zilda Arns. No meio dos destroços uma cruz em pé, a unica coisa que permaneceu em pé durante o violento tremor. Aquela imagem gritou em meu coração, que para muitos é coincidência, pra mim, providencia.
Deus é um Deus  ciumento, e no Haiti, embora 92% da população se declare católica, (não quero com isso dizer que todos devam ser católicos) todos praticam o vudu, e eu como boa católica que sou não poderia falar sobre esse assunto sem atrair sobre mim, a incredibilidade, e até repulsa, portanto valerei me aqui de um texto de André Góes, Mestrando em Antropologia pela Universidade Federal Fluminense (UFF), Bacharel em Ciências Sociais/UFF, especialista em Políticas Públicas em Justiça Criminal e Segurança Pública/UFF e especialista em Relações Internacionais pela UNILASSALE. 


Fato que sempre me chamou a atenção em relação ao Haiti é a quantidade de desgraças ocorridas naquele território. Desde o processo de independência – na última década do século XVIII - até a catástrofe ocorrida esta semana, inúmeros fatos no mínimo estranhos – para os olhos de quem está atento também ao “outro lado” – têm destroçado a esperança de quem torce por um Haiti harmônico.




Desde criança sempre me fascinou as imagens relativas aos zumbis e às bonecas espetadas do vodu haitiano. Boa parte das pessoas ainda associam o Haiti à prática da magia negra, eu faço parte desse grupo. Isso se deve ao fato de enxergar os fenômenos ocorridos naquele país não apenas com os olhos do cientista social, mas também com a experiência de quem é versado em estudos de magia e de religião: servi como guardião (ERRATA: em uma ordem iniciática que levantava a bandeira) da Grande Fraternidade Branca e durante alguns anos trabalhei com diversas entidades na Umbanda.

Quando comecei a trabalhar com entidades, minha intenção era curar mazelas espirituais e físicas de pessoas aflitas. Contudo, conforme os anos passaram, ficava mais claro que eu e minha “coroa” nos distanciávamos do trabalho empreendido pelo grupo, na medida em que parte do trabalho da “doutrina” se voltava para outras finalidades, que julgo serem muito discutíveis. Até hoje não sei o que estava por trás das mudanças na linha da "doutrina", o fato é que os adeptos, à exceção de alguns, estavam interessados nas “macumbas”. Saí desse meio pois não estava de acordo com o entendimento comum.

Nos ritos africanos e/ou afrobrasileiros os indivíduos são extremamente individualistas. Ainda que o discurso seja o da união e do anímico, percebi durante esses anos que as aspirações dos praticantes se voltam para a satisfação de vontades particulares, sejam elas a obtenção de favores: destruição de casamentos, morte de pessoas, ganho de causas judiciais, melhoria financeira etc. O plano do “serviço”, ou seja, do trabalho assistencial, fica muitas vezes em último plano.

Alguém dirá que isso que narro não é a regra. Embora não conheça todos os vudus, umbandas, candomblés e quimbadas da vida, as narrativas são sempre muito próximas: líderes religiosos que cobram por favores, sacrifícios animais e humanos (sic) e por aí vai. A maior parte de centros e terreiros oferece algum tipo de risco ao praticante e não se dedica a reprodução de práticas minimamente éticas.

Devemos comentar um pouco sobre o vudu e suas proporções. Esta prática não está restrita ao Haiti, porquanto mesmo nos EUA - estados do Mississipi e Louisiania – essa manifestação tem força considerável. O vudu haitiano se origina no sincretismo de alguns antigos ritos do Daomé (Benin) com o catolicismo imposto por franceses, ainda no século XVIII. O resultado disso é uma população que se diz católica (mais de 90%) e ao mesmo tempo adepta do vudu (100% ?). Desde 2003, o vudu é religião oficial do Haiti – a ideia surgiu do ex-padre e ex-presidente Jean Bertrand Aristides.

As cerimonias vudus, assim como a de outras seitas e religiões presentes no Brasil, são compostas por rituais de mortificação, sacifícios de animais, práticas com sangue fresco, incorporações, utilização de fumo e álcool. O período das celebrações é o noturno. Os famigerados bonecos são réplicas de seres humanos: os praticantes dizem que servem para praticar o bem a outrem, no que os relatos de turistas, antropólogos e outros estudiosos discordam – na verdade, as alfinetadas serviriam muito mais para infligir algum dano à figura de uma determinada pessoa materializada no objeto.

Já no que diz respeito aos zumbis, versa o antropólogo do museu botânico da universidade de Harvard Wade Davis “O ritual se dá por meio da magia negra [...] a vítima tem todo o indício de morte aparente, quase não respira, tem a pele fria, quase não tem pulsação e, mesmo assim, está viva”. Ou seja, do ponto de vista da espiritualidade e da cosmoética, não há nada de nobre nesse instituto. Há mais, segundo o historiador João Flávio Martinez:

“O bokor, praticante de magias e feitiços, possuído por uma entidade chamada Baron Samedi, fornece as diretrizes para a pessoa que deseja praticar a magia. O “cliente” tem de ir ao cemitério, à meia-noite, e ali apresentar ofertas especiais às divindades. Dali, ele deve tomar um punhado de terra para cada pessoa que deseja matar (esta é considerada uma magia negra para a morte). Após pegar a terra, o praticante deve espalhá-la pelos lugares em que suas vítimas costumam passar. Depois, retira algumas pedras de um túmulo, as quais servirão como instrumentos para realizar o designo maligno. Quando o praticante joga a pedra na porta da casa da pessoa para qual a magia foi direcionada, a vítima começa a adoecer e a emagrecer, chegando à morte em um curto espaço de tempo.”.

Parece óbvio que onde se encontrarem duas pessoas, ou mais, energias, pensamentos, sentimentos e práticas ganharão corpo formando um corpo invisível próprio. Segundo Helena Blavatsky, essa reunião criará algo independente, mais forte que as partes e ao mesmo temo relacionado a elas, pois origina-se da força do grupo: a egrégora. Reforça De Rose que ela é mais atuante o quanto mais antiga e maior a quantidade de membros, retroalimentando-se do que é projetado pelos componentes, à medida que influencia o universo destes. Imaginemos, desse modo, a força da egrégora do povo haitiano, em correlação com a identidade coletiva de praticantes de vudu, que são, na verdade, coincidentes...

No processo de estabelecimento da independência e da república haitiana, a segunda na América, muito sangue foi derramado e ódio perpretado. A pobreza e a escravização capitalista também humilharam o povo haitiano colaborando para que hoje, e ainda mais agora após o terremoto, o Haiti conste como um dos Estados mais miseráveis de que já se teve notícia. Adicionemos as pomposas cortes de sangue dos insanos Papa Doc e Baby Doc mais os anos de Aristides, os dois primeiros usaram e abusaram do vudu; o último reverenciou-o oficialmente.

Para o neófito isso tudo é obra do azar. Reúna, no entanto, os elementos geográficos, econômicos e históricos, adicione uma pitada de práticas psico-energéticas extremamente negativas e teremos um resultado perverso.

Pode até haver coincidência, se defirnimos esse sintagma como a incidência de forças para o mesmo ponto, que, nesse caso, condensa o amálgama de disposições nefastas geradas, reproduzidas e reafirmadas por um povo que insiste na prática indiscriminada da magia negra. São diversos fatores, sem dúvida, porém qual é a influência dessa égregora maligna sobre os ocasos haitianos?

Enquanto o vudu existir com tanta força, não haverá esforço humanitário que dê jeito no Haiti.